Os deputados federais podem iniciar, nesta segunda-feira (20), a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Apesar de estar em discussão pelo legislativo federal desde 2015 – tendo sido uma pauta intensificada desde o início da atual legislatura -, apenas neste fim de semana o Governo Federal apresentou uma contraproposta, que pode desidratar o texto original da PEC.
As modificações sugeridas pelo Executivo Federal geraram críticas de parlamentares envolvidos na Comissão Especial do Fundeb na Câmara dos Deputados. Vice-presidente da comissão, o cearense Idilvan Alencar (PDT) afirma que o Governo errou tanto na forma quanto no conteúdo das mudanças apresentadas.
No último sábado (18), dois dias antes da votação na Câmara, o Planalto sugeriu a líderes partidários que o novo Fundeb só começasse a vigorar em 2022 e que a complementação adicional da União fosse repartida entre o Fundo e o Renda Brasil, programa que deve substituir o Bolsa Família.
Impasse
“Por que não veio há um ano ou há seis meses atrás?”, questiona Alencar. “Enviar uma proposta aos 48 do segundo tempo é um desrespeito aos parlamentares e aos educadores que vinham discutindo o tema. (…) O Governo se ausentou do debate”, critica o parlamentar cearense.
Em reunião, ontem, a relatora da PEC sobre o novo Fundeb, a deputada Dorinha Seabra (DEM-TO), decidiu manter o texto do relatório sobre a proposta divulgado no dia 10 de julho. A decisão foi tomada em conjunto por ela, pelo presidente da Comissão Especial, João Carlos Bacelar (Pode) e pelos dois vice-presidentes, Idilvan e Rosa Neide (PT).
Se aprovado, o novo Fundeb irá ampliar a complementação da União para 20% dos recursos destinados à educação básica – a progressão será gradual e deve atingir o percentual apenas em 2026. Contrário à complementação, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tenta agora destinar metade da complementação da União para um benefício voltado a crianças no Renda Brasil, programa que o Governo quer que substitua o Bolsa Família.
O ministro tenta incluir o Renda Brasil na PEC como forma de garantir dinheiro ao plano, uma vez que o Fundeb ficou de fora do teto de gastos, a regra que limita o aumento de despesas.
O Governo também apresentou a líderes partidários do chamado Centrão – que reúne partidos como PP, PL e Republicanos – uma sugestão de texto que propõe que o Fundeb seja retomado apenas em 2022, modificação rechaçada pela relatora da PEC. “Dessa votação, depende o nosso presente e futuro. Não pode diminuir o percentual (de complementação da União) ou dizer que vai para 2022”, sustenta Idilvan.
Negociação
O deputado federal Capitão Wagner (Pros) também ressalta a urgência na aprovação da proposta. “Não podemos ficar, para o ano de 2021, sem recursos para a educação básica”, afirma. A vigência do Fundeb tem como prazo final o dia 31 de dezembro de 2020. Para ele, a discussão que deve se iniciar na Câmara dos Deputados permitirá encontrar um “meio termo”.
“O Executivo também precisa apoiar, pois será ele o responsável por executar (os repasses para o Fundeb)”, afirma. Ele acrescenta ainda que não encontra nenhum “ponto polêmico” na proposta original. “Dificilmente ela será rejeitada (pela Câmara). Mesmo quem segue a orientação do Governo tem dificuldade de votar contra um proposta de destinação de recursos para uma área importante como a Educação”, explica.
Membro da Frente Parlamentar em Defesa da Educação, o deputado Célio Studart (PV) critica o envio tardio da proposta do Governo. “Isso só prejudica, e fica com a aparência de que quer postergar esse debate. O que é preocupante porque já há uma relação difícil dessa área parlamentar com o Ministério da Educação”, afirma o cearense. O receio, aponta, é quanto a possíveis modificações no texto apresentado pela deputada Dorinha Seabra.
“A votação remota prejudica os debates, porque não há uma articulação de plenário. Então, não há um auxílio no convencimento dos indecisos”, exemplifica o parlamentar. A atenção, assim, deve se voltar aos destaques que podem ser propostos ao parecer sobre o novo Fundeb.
Consenso
Além dos pontos já citados, há outras questões em disputa na votação da PEC. “É praticamente consenso (a proposta). Falta a questão do CAQ (custo aluno de qualidade), que deve sair do texto”, cita o deputado Eduardo Bismarck (PDT). Ele explica que também tem sido levantada a possibilidade de se colocar mais responsabilidades quanto aos recursos federais utilizados para pagar profissionais da Educação.
“A gente gostaria que tivesse mais ganho para Educação, o que já está lá é um avanço do que temos hoje”, resume o parlamentar. O deputado Heitor Freire (PSL) concorda com a necessidade de financiamento na educação básica – da qual o Fundeb é a principal fonte de recursos. Inclusive, lembra ele, pelos impactos orçamentários causados pela pandemia de Covid-19.
“Mas isso não significa que, passada a pandemia, uma nova discussão seja realizada não só sobre as bases de financiamento da Educação, mas também do próprio modelo brasileiro”, completa.
Mudanças na formulação do novo Fundeb
Se aprovada, a Proposta de Emenda à Constituição tornará o Fundeb permanente. Uma mudança considerada fundamental pelos parlamentares, visto que o que está em vigência atualmente tem prazo determinado e acabou deixando brecha para uma insegurança quanto ao financiamento da educação básica. Além disso, o aumento da participação da União é destacado como um avanço.
“O principal da renovação é reconhecer que já havia essa preocupação, ampliada pela pandemia, de aumentar a participação da União, haja visto que municípios e estados tiveram muita dificuldade com a Saúde”, explica Célio Studart. Atualmente, cada unidade da Federação possui um fundo próprio, garantido por parte das receitas obtidas de cerca de 20 impostos diferentes.
A este montante se soma a complementação da União, equivalente a 10% do total de recursos dos 27 Fundos (26 Estados e o Distrito Federal) somados. Em 2019, o Fundeb representou cerca de R$ 156 bilhões para o financiamento da educação básica. O objetivo dessa complementação é diminuir a desigualdade entre Estados. Isto porque como Fundeb é formado, principalmente, por parcelas de impostos estaduais, estados mais ricos tendem a ficar com uma fatia maior. Para tentar reduzir a desigualdade, o Governo aplica acréscimo de 10% nos estados com menos recursos por aluno.
A PEC da Câmara amplia a complementação da União para 20% de modo progressivo até 2026. A equipe econômica reclama que o texto não aponta de onde virá o dinheiro novo. Congressistas defendem, por sua vez, que a definição da origem é papel do Executivo.
O texto prevê ainda a adoção de um modelo híbrido de divisão do dinheiro. A distribuição dos atuais 10% continua sob as mesmas regras, com base na realidade dos estados (e respectivos municípios) que não atingem valor mínimo por aluno.
Parte dos recursos, referente a 7,5% (a serem atingidos em 2026), será distribuída a partir do valor total investido na área por cada rede. Esse modelo contempla municípios pobres e com baixo investimento em estados mais ricos e que, no sistema atual, não são levados em conta.
Outra parte dos novos recursos, um total de 2,5%, será distribuída a redes de ensino estaduais que obtenham bons resultados em indicadores de aprendizagem. Esse formato ainda não está definido. “Esta é uma contribuição cearense, porque é um modelo que nós adotamos de incentivo nos municípios”, lembra Idilvan Alencar.
Diário do Nordeste
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